As mudanças climáticas globais deveriam incomodar os resorts litorâneos do Nordeste brasileiro?

O presente artigo apresenta uma primeira análise das possíveis consequências das mudanças climáticas globais no negócio dos resorts do Nordeste brasileiro, especificamente aqueles situados à beira mar e/ou próximos à linha costeira, no contexto da esperada elevação do nível dos mares. Com base em pesquisa bibliográfica e documental, a argumentação desenvolvida buscou evidenciar como as atuais mudanças estão impactando o negócio dos resorts e como deverão impactar no futuro. Os resultados obtidos apontam tanto para a elevação do nível médio dos oceanos em decorrência do aquecimento global quanto sobre o Nordeste ser a região mais vulnerável para as mudanças climáticas no Brasil. Isso se deve pelo histórico de erosão relacionada a causas naturais, sendo agravada pela má ocupação da zona costeira, pelas alterações antropogênicas e vulnerabilidade socioeconômica. Como principais considerações finais, aponta-se que: o assunto das mudanças climáticas ainda é pouco enfocado pelos resorts; embora o turismo tenha resiliência e capacidade de recuperação, os resorts pouco poderão fazer em virtude das mudanças climáticas extremas; até o momento, os fatos aqui destacados não inibiram ainda a construção de novos empreendimentos. Por último, esse estudo visa preencher uma lacuna em estudos que relacionem hotelaria e mudanças climáticas no Brasil, alertando tanto a comunidade científica como os próprios estabelecimentos, sobre a necessidade de mais estudos sobre esses impactos, visando atitudes concretas em direção à uma maior sustentabilidade.

A sustentabilidade do turismo é um conceito complexo, devido à sua natureza multidimensional, relativa e latente. Multidimensional, pois, por definição, a sustentabilidade deve ser observada por diversos aspectos. Relativa, pois tudo depende do referencial utilizado e da realidade do destino turístico. Latente, pois existe um intervalo variável entre a prática das ações e a observação de seus efeitos concretos (Fernández & Rivero, 2009).

Desde a elaboração do conceito de desenvolvimento sustentável pela ONU no final dos anos 1980, foram propostos e colocados em prática muitos projetos, ferramentas e modelos de gestão. Porém, o processo está longe de atingir o estágio em que as mudanças possam ser implementadas no modelo vigente de desenvolvimento econômico. Consequentemente, as principais causas de insustentabilidade ainda permanecem, embora alguns de seus sintomas tenham sido tratados. Nem a real necessidade de ação firme sobre esses problemas foram aceitos por instituições governamentais, pelo mundo dos negócios, ou mesmo por indivíduos. A aprovação dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio no ano 2000, seguida pelos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável em 2015, demonstraram a necessidade de indicadores que permitissem supervisionar o progresso em direção a esses objetivos, individual e coletivamente (Fernandez & Rivero, 2009).

A aplicação prática da sustentabilidade nas sociedades humanas deriva de um histórico de alertas levantado por pesquisadores em um primeiro momento, notadamente ambientalistas, sendo assumida posteriormente por autoridades políticas. As discussões realizadas a partir do final dos anos de 1960 culminaram com a publicação do relatório Nosso Futuro Comum, em 1987. Neste, são apontadas três dimensões para o desenvolvimento sustentável – economia, ambiente e sociedade (World Commission on Enviroment and Development [WCED], 1987) – as quais são ampliadas para seis por Sachs (1993). Partindo do viés de suporte do ambiente sugerido em WCED (1987), a discussão proposta neste trabalho se alinha com as dimensões “conservação dos recursos naturais” e “equilíbrio da configuração territorial” de Sachs (1993). Porém, permeia também o “desenvolvimento econômico intersetorial equilibrado”, pontuado pelo mesmo autor, pela natureza da atividade turística.

O contexto desta tentativa de propor novos modelos de pensar e agir em sociedade deriva de uma crise coletiva, pautada no ritmo e forma de consumo dos recursos naturais, bem como dos modelos de configuração territorial. A junção destas duas variáveis basilares pode ser materializada em diversos problemas na relação entre as sociedades e o ambiente, como a saúde, a desigualdade social e o tema em destaque na presente reflexão: o aquecimento global e suas consequências. O aumento das concentrações de gás carbônico (CO2) na atmosfera em escalas nunca experimentadas pela espécie humana (Kunzig, 2013) é compreendido como um dos principais fatores para o aumento médio das temperaturas em diversas regiões do globo terrestre, com consequente redução de geleiras permanentes em porções de terra e posterior elevação do nível dos oceanos (U.S. Global Change Research Program [USGCRP], 2014). Neste contexto, observa-se uma ameaça às populações costeiras e, em destaque nesta análise, para os resorts.

Partindo deste contexto-problema, a presente pesquisa buscou verificar se já existem indícios, nos últimos anos, de problemas nas regiões costeiras do Nordeste brasileiro que possam estar associados às consequências do aquecimento global, com foco nos resorts instalados na região. Ao mesmo tempo, este artigo tem o objetivo de ocupar uma brecha presente em estudos brasileiros que discutam os resorts na conjuntura das mudanças climáticas em curso. Desta forma, pretende-se também alertar não só os resorts, como os demais estabelecimentos litorâneos, para atitudes concretas. Tanto em relação ao aumento do nível do mar, como principalmente em direção à uma real sustentabilidade.

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Fonte: Rtep