Caio cria o Iº Salão do Automóvel

“Não conseguia encontrar o carro dos meus sonhos, então projetei um.” Ferdinand Porsche

Queridos leitores, antes de estacionarmos em frente ao Pavilhão de Exposições do Ibirapuera, para darmos uma olhadinha de relance no I Salão do Automóvel, acho que seria importante eu falar um pouco dos anos 1950, justamente por ter sido o marco do nascimento de uma fascinação dos brasileiros pelo automóvel e do desejo escancarado de poder comprar um. Desejo esse, que acabou se tornando num verdadeiro chamariz para as montadoras estrangeiras investirem no país: “O Brasil virou prioridade para todas as montadoras” falou numa entrevista o superintendente da Fiat. “Nos países ricos, as vendas estão estabilizadas, quem queria ter carro tem, enquanto no Brasil a proporção entre automóveis e habitantes ainda é relativamente pequena, inferior ao de países com renda comparável com a do Brasil como é a do México”. Tanto que passado 20 anos a Fiat, instalada em Minas Gerais aumentaria em quase 50% o PIB daquele Estado, fazendo com que Minas pulasse de 4º para 2º lugar na lista dos Estados mais ricos do Brasil.

Para as famílias brasileiras, o carro se tornou algo absolutamente indispensável, se transformando num instrumento de liberdade, conforto e status. Pela primeira vez o brasileiro podia morar mais longe do trabalho e muito melhor. Graças ao automóvel, os filhos puderam estudar em escolas sonhadas pelos seus pais, mesmo que ficassem do outro lado da cidade. A classe média, se antes, nos finais de semana, passava presa em casa, podia agora se programar para visitar seus parentes no interior ou gozar o prazer de um banho de mar, no litoral paulista. Desde que o Peugeot de Santos Dumont desembarcou de Paris por aqui, trouxe consigo tanto glamour, charme e brilho, que deixou como herança aos carros que vieram depois dele, seu encanto e poder de sedução.

Caio sabia ao apoiar a determinação do Presidente Juscelino Kubitschek que esse era o momento de instalar aqui a Indústria Automobilística, e dele criar o seu tão sonhado Salão do Automóvel, igualzinho aos que já existiam há anos, nos Estados Unidos, França e Alemanha. Os dados falavam por si só, em 1957 foram lançados os primeiros carros fabricados no Brasil. Com uma população de 63,6 milhões de habitantes e uma frota de automóveis de 785,1mil unidades, chegava-se a marca de 81 habitantes por veículo. Entre 1957 e 1958, a frota de automóveis aumentou cerca de 360% e a de ônibus e caminhões, respectivamente, cerca de 194% e 167%. Embora, a consequência inevitável foi o abandono das ferrovias, e a dependência do Brasil a extensão e conservação das rodovias e ao uso dos derivados do petróleo, a ditadura do automóvel chegou e o capitalismo no mundo inteiro, se curvou ao seu poder.

No Brasil, o cenário era absolutamente animador e exigia um Salão do Automóvel, como demonstrava Caio para sua equipe: “ Em 1957, o total de veículos foi 30.000, em 1958, a produção subiu para 61.121, em 1959 o total foi de 96.243 tanto que para esse ano, 1960, o da inauguração do nosso Salão do Automóvel, a estimativa é de 140.000 veículos, incluindo caminhões, jipes, automóveis, ônibus e furgões”. E para reforçar a importância da Indústria Automobilística e do papel de apoio do Salão do Automóvel a essa indústria, Caio lembrou à sua equipe que esse grande salto obtido pela indústria representava nada mais nada menos, do que uma inestimável contribuição para a balança nacional de pagamentos, uma considerável economia de divisas e principalmente a possibilidade da emancipação econômica do País. Temos que ressaltar que o cenário da indústria de autopeças, também é muito promissor, neste ano de 1960, temos 1200 fábricas trabalhando a todo vapor produzindo autopeças e acessórios”.

Apesar dos números positivos e de um cenário repleto de potencialidade, todas as vezes que o Caio se reuniu com JK para tratar do Salão do Automóvel, ele batia na mesma tecla: “Presidente, infelizmente o nosso maior problema é a desconfiança e a insegurança que os brasileiros têm com relação a qualidade dos automóveis brasileiros. E com relação à nossa indústria automobilística, esta ainda apresenta índices muito baixos de nacionalização, o que complica e muito fazermos propaganda dos “nossos carros brasileiros.” O senhor percebe a saia justa em que nós nos encontramos para colocar o Salão do Automóvel “sobre rodas?”. “Juscelino sorria, e dizia: “Caio, meu grande amigo, conto 100% com você para me ajudar a desenvolver a Industria Automobilística do nosso País. Sua grande arma é o Salão do Automóvel e a sua munição é a propaganda, em ambas você é o grande mestre. Você terá que convencer o consumidor brasileiro que o automóvel que se monta aqui, é tão bom e tão seguro, quanto aquele que é importado. E isso só você nesse Brasil saberá como fazer, e eu tenho certeza que o crescimento e o sucesso do seu Salão se confundirá com a Industria Automobilística, e eu lhe serei eternamente grato pelo seu esforço.”

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Caio aproveitou o milagre do silêncio do escritório, para dar uma olhada nas notícias sobre a inauguração do I Salão do Automóvel. Abriu a Folha de São Paulo e com o coração aos saltos leu uma matéria de página inteira: “Veja no I Salão do Automóvel, inaugurado no dia 26 de novembro de 1960, como a indústria automobilística brasileira está contribuindo para a emancipação econômica do País. Valores dos veículos produzidos se fossem importados: em 1957, 1958 e 1959, bateriam o total de 700 milhões de dólares saídos do país. Você se sentirá orgulhoso visitando o I Salão do Automóvel e poder ver o Panorama da Indústria Brasileira”. “Grandes atrações e prêmios para o público” “Salão do Automóvel patrocinado pelo: Sindicato da Indústria de Caminhões, Tratores, Automóveis e Veículos Similares do Estado de SP”

O Salão do Automóvel foi um absoluto sucesso, com todos os “motores ligados” estremeceu São Paulo e causou um enorme furor. As filas intermináveis davam voltas e voltas em volta do Pavilhão da Indústria e Comércio do Parque Ibirapuera. Diariamente mais de 80.000 mil pessoas se amontoavam para ver as grandes vedetes da Indústria Nacional: olhar de perto um Fusca era uma emoção tão grande que apesar de não ser nada diferente daquele que se via nas ruas, lá no estande da Volks, debaixo dos holofotes, parecia se tratar de outro carro, isso sem falar no Fusca que o público antes mesmo de entrar no Pavilhão, encontrava lá fora, dentro do lago do Ibirapuera, como se fosse um carro anfíbio. Da família Volkswagen a Kombi competia orgulhosa em Ibope, com o próprio Fusca.

O Dauphine, o Simca Chambord, o Aero Willys, o FNM 2000 JK, o Chevrolet Amazonas e o DKW também eram uma grande sensação. Mas uma pequenina estrela brilhava enormemente, era o minúsculo Romi-Isetta, que todo mundo se acotovelava para ver, por se tratar do primeiro automóvel de passeio produzido no Brasil. Esse estranho carrinho tinha uma única porta frontal na qual ficava preso o volante. Esse estiloso carrinho jogava audaciosamente pela janela, todos os conceitos do que até então se costumava chamar de carro. Além dele, outra novidade tupiniquim, enchia os olhos e o peito dos visitantes de orgulho, o Saci, um incrível Rural Willys conversível.

Foi com a exposição de veículos em maravilhosos estandes, de onze fábricas nacionais, além de dezenas de produtores de peças e componentes para automóveis e similares, que o I Salão do Automóvel abriu suas portas à visitação pública no Pavilhão do Ibirapuera.

Bem ao estilo do Caio, o Salão do Automóvel não podia deixar de apresentar um sem número de atrações especiais, como uma bem cuidada Exposição de Carros Antigos. Claro que também não poderia faltar a presença de artistas nacionais em tarde de autógrafos, desfiles de moda, painéis retrospectivos da evolução do automóvel, estandes onde moças contavam a história do automóvel, com painéis de fotografias de todos os carros antigos. E como não podiam faltar e que deixavam as pessoas alucinadas eram os megas sorteios realizados todas as quintas e domingos de cinco carros nacionais 0 km, nos quais poderiam concorrer todos os visitantes que tivessem pago a entrada e preenchido um questionário sobre a Indústria Automobilística Nacional.

Todos os estandes estavam muito bem decorados, o público não escondia o seu encantamento. O Pavilhão inteiro tinha luzes poderosas que iluminavam os automóveis por todos os ângulos. Os jornais no dia seguinte noticiaram que “As montadoras Willys Overland, Mercedes-Benz, General Motors, Ford, Fábrica Nacional de Motores, Toyota, Scania Vabis, Volkswagen, Simca Internacional, Harvester e DKW-Vemag eram as joias da coroa”. Moças lindíssimas, as chamadas recepcionistas, se movimentavam em volta das “poderosas” máquinas, com seus vestidos longos de festa, maquiadas de uma maneira que a mulher brasileira não conhecia e não sabia como reproduzir em si mesmas, o que acabava gerando muita inveja. Na verdade estavam vestidas para seduzir, se insinuavam apenas com o movimento de entrar e sair dos carros, sentavam nos capôs, cruzavam as pernas longas e lindas e como perfeitas estátuas romanas paralisavam a população masculina que se avolumava em volta do estande a ponto de quem tivesse ouvidos bem afinados podia escutar os corações desses aparvalhados cavalheiros baterem acelerados dentro do peito. E quanto às “máquinas”. Ah! essas misturavam-se e competiam com as mulheres na arte de seduzir os pobres mortais, que saiam do Salão do Automóvel absolutamente decididos a comprar um carro novo. O carro dos seus sonhos.

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